sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

HOMENAGEM AOS ASSOCIADOS DA CASA DOS ESTUDANTES DO IMPÉRIO

HOMENAGEM AOS ASSOCIADOS DA CASA DOS ESTUDANTES DO IMPÉRIO_Debate na Assembleia da Répública- 24 de Fevereiro de 2015
                              
           

“A CASA DOS ESTUDANTES DO IMPÉRIO E O MOVIMEMTO ASSOCIATIVO ESTUDANTIL”


Em primeiro lugar, permito-me agradecer o convite que me foi feito pela UCCLA para participar neste debate e saudar vivamente esta iniciativa que põe em destaque o papel histórico da C.E.I. na luta não só antifascista em sintonia com as forças progressistas portuguesas, mas também a mobilização dos estudantes africanos às ideias anti colonialistas.

Permito-me também saudar todos aqueles, aqui presentes ou ausentes, que participaram  de perto ou de longe nesses “anos de fogo” A vossa presença traduz o espírito da Casa dos Estudantes do Império, regido pelos valores da cultura, da solidariedade e da liberdade.

Nesta catarse dos valores e princípios que regeram as nossas lutas, não queria deixar de manifestar o meu mais profundo respeito e homenagem a tantos camaradas da minha geração, já desaparecidos, que contribuíram com inteligência , coragem e determinação em prol das lutas pela liberdade dos seus povos. Foram eles  João Vieira Lopes, Gentil Viana, Paulo Jorge, Graça Tavares, Iko Carreira, David e José Bernardino, Fernando Costa Andrade, Carlos Ervedosa, Daniel Chipenda, Rui de Carvalho,  Jorge Hurst entre outros. Raros são os camaradas ainda vivos que podem testemunhar os acontecimentos dos anos cinquenta e sessenta no século passado na C.E.I. 

A Casa dos Estudantes do Império foi uma associação criada em 1944 pelo Regime de Salazar para melhor controlar os estudantes que vinham das colónias portuguesas. Assim, no ato de inauguração da Sede, na Avenida Duque de Avila, 23, em Lisboa, o ministro das colónias de então afirma:  “A organização da CEI era indispensável (ao regime )… sabendo nós que podemos contar com a vossa dedicação, patriotismo e boa vontade, e permite criar entre os estudantes uma mentalidade nacional mais profiqua. Cada vez mais  as nossas colónias estão integradas no pensamento do continente, e é bom reforçar o elo que reúne o escol do ultramar  e do continente.” Dixit.

 A CEI desenvolveu durante anos uma intensa atividade associativa e cultural, apoio assistencial e promoveu o desporto e ações culturais, reunindo estudantes oriundos de várias colónias africanas , indianas e macaenses.

A CEI foi um lugar de convivência , de afirmação de valores próprios a cada território e de exercício de participação democrática na autogestão da associação. Desde a sua criação, foram várias as gerações que imprimiram um espírito unitário peculiar à CEI , um oásis de democracia e de liberdade  numa sociedade obscurantista e repressiva. 
A fisionomia da CEI evoluiu muito desde a sua criação em 1944, sendo nos primeiros anos dirigida por estudantes filhos de colonos e de altos funcionários coloniais e com ideias muito ligadas ao regime. A CEI foi, com efeito, criada para servir o regime, mas, com o tempo,  transformou-se no seu contrário, numa arma poderosa nas lutas antifascista e anticolonialista.

Mais tarde, nos anos 1948 a 1950, apareceu a geração dos “Mais Velhos”, com nomes prestigiosos como o de Amilcar Cabral, Mário Pinto de Andrade , Agostinho Neto e Lúcio Lara,  tendo alguns deles feito parte dos Corpos Gerentes da C.E.I.

A tomada de consciência política dos estudantes africanos “Mais Velhos” passou, primeiro, pela militância nos movimentos da oposição portugueses, sobretudo no Movimento de Unidade Democrátitica (MUD Juvenil). Só muito mais tarde é que alguns deles viriam a ter relações mais estreitas com o Partido Comunista Português, tendo Lucio Lara participado no VºCogresso em 1957, no Estoril.

Esta atitude de militância nos movimentos de oposição portuguesa decorria da inexistência, nessa época, de movimentos africanos anticolonialistas estruturados e ativos nas colónias e da noção de que, radicados em Portugal, estavam obviamente impossibilitados de fazerem um trabalho de politização das massas africanas. 
Também a idéia emanada pelos ideólogos do PCP, era a de que a libertação das colónias passava prioritariamente pelo derrube do fascismo, ideia essa que travou durante anos a eclosão de um movimento anti colonial autónomo, entre os estudantes africanos.
Houve, portanto, um longo período , até 1957, em que os “Mais Velhos” participaram ativamente na luta anti fascista,  tendo alguns sofrido com prisões prolongadas e torturas nos calabouços da PIDE ( Ivo Lóio, Carlos Veiga Pereira , Agostinho Neto, Fenando Mourão ), tento outros optado pelos rigores do exilio (Marcelino dos Santos, Mário de Andrade, Aquino de Bragança e eu próprio).

E foi graças a essa participação na luta anti fascista que os jovens africanos foram esclarecendo os seus camaradas portugueses sobre a cruel realidade do anacrónico, desumano e repressivo colonialismo português, num processo de mútua formação. Esta ação esclarecedora da realidade colonial teve certamente uma grande influência na tomada de posição do PCP a favor da autodeterminação e independência das colónias no Vº Congresso em 1957 no Estoril, em que participou Lúcio Lara.

Os estudantes “Mais Velhos” só raramente apareciam na Casa, preferindo encontrarem-se no recato dos salões da Ti Andreza, santomense de boas famílias, que dispunha de um magnifico apartamento na Rua Actior Vale, 37, em Lisboa, onde encontravam um ambiente diferente. Era um espaço de intercâmbio de ideias, de discussão, de conversa, de papo, daquilo que cada um sabia, palestras, poemas, estudos e que permitiu a “aproximação de gerações e a transmissão de um caldo de culturas em vias de desaparecer”. E assim nasceu o Centro de Estudos Africanos, frequentado por Alda Lara, Francisco Tenreiro, Mário de Andrade, Agostinho Neto, Amilcar Cabral e Alda Espirito Santo.

A idéia fulcral era o retorno âs fontes, a redescoberta do Eu africano, a reafricanisação de assimilados que eles eram de facto, a tomada de consciência da total alienação pelo facto de terem sido dos poucos eleitos “portugalizados” que conseguiram ultrapassar todas as barreiras e atingir a suprema etapa do ingresso nas universidades portuguesas. A comunicação entre eles, os processos mentais processavam-se necessariamente em português  de tal modo a alienação cultural tinha sido global, estrutural.
Esse movimento cultural no Centro de Estudos Africanos , nos anos cinquenta evoluía , simultaneamente, com fenómeno idêntico, em Luanda, liderado por Viriato da Cruz , “ Vamos descobrir Angola” e que tanta importância viria a ter no despertar da consciência nacionalista.

Nessa busca cultural para se reafricanisarem, para reencontrarem as suas raízes, iam descobrindo e dissecando a iniquidade do sistema colonial que os tinha alienado. E descobriram muito mais coisas: a inexorável máquina de exploração e de aviltamento de milhões de homens e de mulheres africanas nas colónias. E nesse processo de descoberta chegaram à conclusão de que pertencia à sua geração a “responsabilidade histórica” de denunciarem ao mundo a situação dos seus povos e de assumirem o “compromisso real”, o engajamento total na luta pela independência dos seus países. Essa posição de rutura definitiva com o colonizador era inovadora, senão revolucionária.

Uma das obras literárias que iria ter uma influencia considerável no despertar das consciências dos jovens africanos em Portugal e que constituiu um marco fundamental da afirmação dos valores culturais  e da personalidade africana na época, foram “Os Cadernos de Poesia Negra de Expressão Portuguesa”, publicados no Centro de Estudos Africanos, por Mário de Andrade e Francisco Tenreiro, em Lisboa, e que revelou a negritude  na literatura africana de expressão portuguesa.

No entanto, os “Mais Velhos”, caldeados na militância no MUD Juvenil e no PCP, sentiam que as reuniões no Centro de Estudos, embora enriquecedoras,  eram muito teóricas. Alguns deles, essencialmente Lucio Lara, Mário de Andrade e Agostinho Neto juntaram-se ao grupo de trabalhadores marítimos africanos, numa agremiação de caracter  recreativo e cultural, unidos na mesma aspiração de promoção do Homem Africano e inseridos no combate comum pela liberdade das suas terras. Essa associação de jovens intelectuais e de trabalhadores africanos conferiu ao Clube Maritimo Africano um papel histórico relevante,  de caracter inédito para a época.

Era ali que  educavam e consciencializavam os marítimos africanos e suas famílias, era ali que encontravam os camaradas trabalhadores marítimos nos navios que demandavam os portos africanos e brasileiros, e que serviam de “correio” permitindo o contacto com os movimentos nacionalistas africanos nas colónias.

 Esta aproximação de intelectuais africanos com marítimos africanos,  era a consequência lógica da prática marxista e da necessidade em contactarem os nacionalistas,  tanto em Angola como na Guiné. 

Gradualmente, e com o passar dos anos a CEI foi frequentada por um numero cada vez maior de  jovens africanos , a Nova Vaga, mestiços e negros, os quais deram um novo cariz, uma nova tonalidade, uma nova orientação  ao processo cultural de busca de uma identidade africana e rasgou  novos horizontes abertos às ideias de liberdade e de progresso.

 Este terceiro período na vida da CEI ficou marcado pela tomada de posse de jovens estudantes mestiços e negros e uma orientação marcadamente anti colonialista na politica associativa , com a direcção assumida, primeiro pelo mozambicano Fernado Vaz, em 1957.58, depois pela direcção orientada pelo angolano João Vieira Lopes, em 1959, e no ano seguinte , pela direcção do indiano Oscar Monteiro, onde se destacaram Gentil Viana, Paulo Jorge e eu próprio. Muitos de nós participou também nas atividades das associações estudantis portuguesas.

A minha participação nas atividades da CEI divide-se em dois períodos:
 o primeiro, em Coimbra, de 1949 a 1951, anos em que tomei contato com a cultura africana em colóquios e debates, o que permitiu a  tomada de consciência da minha africanidade. Foi nesse período que conheci  Agostinho Neto, Carlos Veiga Pereira e Lucio Lara entre outros estudantes africanos que frequentavam a CEI em Coimbra.
- o segundo período de militância e vivência na CEI vai de 1954 a  1961, período em que, para além dos meus estudos de Medicina, participei ativamente não só nas atividades associativas em todos os domínios chegando a ser vice-presidente da Direção na CEI, em 1959, mas também em atividades clandestinas.

As atividades clandestinas dos estudantes da CEI são pouco conhecidas, e por isso irei debruçar-me neste aspeto particular.

As minhas atividades clandestinas começaram ainda em Coimbra no MUD Juvenil em estreita ligação com Lucio Lara, Agostinho Neto e outros camaradas. A minha ida para França, em 1951, evitou então ser detido pela PIDE.

De regresso a Portugal, em 1954, embrenhei-me na difusão de ideias anti colonialistas e antifascistas entre os estudantes na Casa.. Nessa altura, desenhava-se no seio da CEI duas correntes ideológicas:

A corrente marcadamente marxista, orientada por David e José  Bernardino, estreitamente ligada ao PCP.  Esta corrente enraizou-se sobretudo entre alguns angolanos do Sul de Angola e também entre alguns mozambicanos. Esta corrente teve alguma importância na CEI, pois ocuparam diferentes cargos em várias direcções .

A segunda corrente de carater nacionalista, agrupava muitos elementos jovens, da Nova Vaga, e  tinha por objetivo a afirmação da nossa identidade africana, a troca de ideias sobre o futuro dos nossos países .

No entanto, só em Novembro de 1957, é que esta corrente nacionalista se afirmou, após uma reunião em Paris sobre: “ a situação politica nas colónias portuguesas e meios de luta para atingir a independência nacional.”. 
Estiveram presentes nessa reunião histórica , antigos membros da CEI como Mário de Andrade, Amilcar Cabral, Marcelino dos Santos, e Guilherme Espírito Santo. Também presente Viriato da Cruz, recém chegado de Angola,  o único não membro da CEI presente.

As teses  e o programa do Partido Comunista Angolano apresentados por Viriato da Cruz  foram rejeitados, tendo prevalecida a via do Movimento Nacional (Rassemblement)), a qual propunha a unidade de todas forças e classes sociais no processo de luta pela  independencia nacional.

Foi decidida , então, a criação do Movimento Anti Colonialista  (MAC), cuja sede viria a ser instalada, pouco tempo depois, em Lisboa, por aí estarem concentrados numerosos estudantes e trabalhadores africanos.

A pedido de Lúcio Lara, eu reuni em Lisboa, numerosos estudantes africanos da CEI .  Foi ,  então,  decidido apoiar e participar no Movimento Anti Colonial, tendo sido escolhidos três elementos , Iko Carreira, Carlos Pestana e eu próprio, como delegados da Nova Vaga na cúpula do MAC, onde já participavam Agostinho Neto, Lucio Lara, Amilcar Cabral e Eduardo dos Santos.

As atividades do MAC foram orientadas nas duas associações que tinham um grande numero de africanos: a CEI e o Clube Maritimo Africano.
Eu fui incumbido das relações com o PCP, através do camarada Vasco Cabral. O PCP dava-nos apoio logístico na publicação de panfletos e permitia veicular notícias sobre as colónias no jornal Avante.
As atividades do MAC esmoreceram com a saída de Lara para a Alemanha em Março de 1959, de Agostinho Neto para Luanda em Dezembro de 1959 e de Amilcar Cabral para a Guiné.

As eleições legislativas em 1958, provocaram a mobilização de muitos estudantes africanos do MAC a favor do General Humberto Delgado, Logo após a sua derrota , alguns jovens tentaram lançar a intentona da Sé. O nosso grupo era composto por Jaime Serra, Fonseca e Costa, Ligia Monteiro, e eu próprio reunimo-nos na Sé, em Lisboa. O falhanço desta operação levou à minha fuga para Angola.
 Aí tive contatos com alguns dirigentes dos movimentos nacionalistas, e fui incumbido de organizar os estudantes angolanos, em Portugal,  num quadro nacional. João Vieira Lopes, Gentil Viana, Alberto Bento Ribeiro, Graça Tavares e eu próprio, adeiram e formaram a cúpula do Movimento dos Estudantes Angolanos (MEA).

O MEA prosseguiu a política de consciencialização e de mobilização dos estudantes e dos trabalhadores angolanos em Lisboa. O MEA estendeu as suas atividades a Coimbra ( Manuel Videira e Chipenda ) e ao Porto.(Lima de Azevedo).

As relações com os estudantes portugueses reunidas na R.I.A. tiveram nos anos sessenta, um grande desenvolvimento. As reuniões da cúpula da RIA passaram a realizar-se, em segredo, no 3º andar da sede da C.E.I. tendo o José Bernardino sido o nosso delegado. Desta maneira , os estudantes africanos estiveram empenhados no processo democrático  da luta dos estudantes portugueses.

Os acontecimentos de 4 de Fevereiro em Angola foram acolhidos com alvoroço e ansiedade.

Recebemos, então, um Apelo da Direção do MPLA, sediada então em Conakry, no sentido de enviarmos alguns elementos mais preparados politicamente para se juntarem aos poucos elementos que constituíam a Direcção Provisória do  MPLA no exterior, Viriato Cruz, Mário de Andrade e Lúco Lara.  Como as comunicações com Conakry, através da embaixada egípcia,  eram muito demoradas, a direção do MEA decidiu enviar para o exterior dois elementos: Graça Tavares e eu próprio. Saímos pela fronteira de Vila Real de S. António e chegamos a França, em Niort em casa de um amigo meu, Marc Antoine Delanné. Aí entrámos em contacto com a direção do MPLA em Conacry , mas a resposta do MPLA foi dececionante:  o MPLA  dizia não ter meios logísticos para apoiar a saída de Portugal de estudantes africanos.

Fomos então para a Alemanha, onde fomos acolhidos com amizade e solidariedade por Luis de Almeida em sua casa , em Birkesdorf. Já havia nessa altura um embrião de organização dos estudantes africanos das colónias portuguesas no exterior, a UDEAN , dinamizadas sobretudo por José Carlos Horta e por Luiz de  Almeida. 
Esta ligação entre os estudantes africanos no exterior de Portugal  e os estudantes africanos da Casa dos Estudantes do Império, em Portugal, foi muito importante na dinâmica das lutas de libertação.

Foi, contudo, a realização do 1º Congresso Constitutivo da UGEAN, em Setembro de 1961, em Rabate, Marrocos, que lhe conferiu uma legalidade internacional e  permitiu dar  uma outra dimensão à luta anticolonialista dos estudantes das colónias portuguesas no exterior e. , também, dar uma base de apoio a todos  aqueles estudantes que iam saíndo de Portugal.

Uma das operações mais espetaculares foi a FUGA clandestina de Portugal de cerca de uma centena de estudantes africanos  em Junho de 1961.  Esta fuga foi uma operação montada pelo Movimento de Estudantes Angolanos, apoiado pela CIMADE, organização protestante com sede em Paris e pelo governo francês de Couve de Murville.  Refutamos, assim, as afirmações avulsas de certos “historiadores” que atribuem ao PCP um papel de relevo na organização dessa FUGA. Está presente entre nós o camarada Tomás Medeiro que teve um papel ativo nessa fuga.

Uma parte dos elementos que participaram na FUGA foi integrar os movimentos nacionalistas PAIGC  (Pedro Pires), FRELIMO e MPLA. Neste ultimo movimento, João Vieira Lopes e Graça Tavares integraram a Direcção política, Iko Carreira foi encarregado de criar as forças armadas angolanas, e dez médicos integraram o Corpo Voluntário Angolano de Ajuda aos Refugiados (CVAAR), sendo eu um dos voluntários. Mais tarde, Manuel Lima juntou-se ao MPLA tornando-se o primeiro comandante militar.
Os médicos voluntários que integraram o CVAAR eram todos membros da Casa dos Estudantes. Iko Carreira afirma que o CVAAR constituiu a cobertura jurídica do MPLA no Congo Leopolville, pois o MPLA nunca conseguiu a autorização legal  do governo congolês para exercer as suas actividades politicas no Congo. Os postos do CVAAR ao longo da fronteira com Angola serviram também de depósito de armas destinadas à luta armada.
A maior parte dos estudantes da Casa do Estudantes do Império que participou na FUGA continuou os estudos , graças às inúmeras bolsas de estudos obtidas pela UGEAN em vários países,
Em Conclusão, pensamos que a Casa dos Estudantes do Império desempenhou um papel histórico ímpar , na tomada de consciência dos jovens africanos, na denúncia do fascismo e do colonialismo e, mais tarde, na participação ativa na luta pela emancipação e pela independência nacional. Em todas as etapas fundamentais, a criação do MAC e do MEA, a FUGA dos estudantes, o Congresso Constitutivo da UGEAN, no CVAAR e na Direção do MPLA , no PAIGC ou no FRELIMO, estão presentes estudantes da Casa dos Estudantes do Império.

Neste contexto, cada um de nós deu o seu contributo não só na luta anti fascista , mas também à emancipação dos nossos povos. Foi a geração da coragem, do empenhamento nacionalista e do sonho. 

Após  a FUGA, a C.E.I. nunca mais seria a mesma. Apesar dos esforços levados a cabo pela equipa de Carlos Ervedosa e de julio Correa Mendes, nunca mais houve a mesma pujança e dinamismo. As organizações clandestinas deixaram de existir. No entanto, o espírito da Casa manteve-se graças à quarta geração de estudantes africanos , de que a Aida Freudentale , a Rute Magalhães e o Vitor Ramalho, são a expressão.
Esta atitude dos estudantes africanos na CEI de participação ativa na luta antifascista primeiro, e anti colonialista depois pode servir de exemplo às juventudes africanas dos países de língua oficial portuguesa na sua participação ativa na construção dos seus países num quadro democrático , de progresso e de liberdade.

Edmundo Rocha
Médico e escritor
edmundorocha@hotmail.com 
Lisboa, 28. 11.2013

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Discurso do Presidente da Liga Africana - Tomada de Posse - Novos Corpos Sociais

Intervenção do Presidente da Direcção da Liga Africana por ocasião do empossamento seu e dos Órgãos Sociais  para o triénio 2015-2017

 
Tomada de posse dos Novos Corpos Directivos da Liga Africana

 
 
 
Saudações aos presentes:


Não se pretendeu, intencionalmente, conferir solenidade ao presente momento à altura da tradição da Liga Africana, em virtude da concomitante ocorrência de acontecimentos inesperados e conjunturais na sociedade, mas com reflexos muito condicionantes na disponibilidade de alguns colegas em participarem neste acto e na hospitalidade e beleza que os experientes responsáveis da Liga Africana sabem agraciar aos seus convidados no quadro das suas actividades.

Inesperado foi o passamento para o mundo metafísico de um respeitado cidadão e membro da família Vieira Lopes, a qual tem igualmente laços de parentesco com as famílias Jardim e Araújo, das quais provêm alguns membros dos órgãos sociais que são empossados neste singelo acto; conjunturais são os temores inerentes ao desfavorável momento económico nacional, oportunamente bem caracterizado e bem explicado a nação por Sua Excelência o Chefe do Estado e do Executivo do nosso país, Eng. José Eduardo dos Santos e no contexto institucional, o desconforto da Liga Africana de (ainda) não poder dispor de espaço suficiente para o seu funcionamento, numa infraestrutura que a abriga por obséquio e edificada pela sua precursora.

Cumpre-nos manifestar, em nome de todos sócios da Liga, a nossa comunhão de sentimentos de pesar às famílias Vieira Lopes e Jardim, por aquela ocorrência inesperada e infausta; as questões conjunturais nacionais e institucionais só podem impelir a cada um de nós a trabalhar e a dialogarmos ainda mais e melhor, no sentido de as dissiparmos a breve trecho.

Apesar dos constrangimentos acima citados, não nos podemos isentar da obrigação de, de forma sumária, fazer verter algumas despretensiosas, e pela natureza caloira nossa nesta actividade, tão desajeitadas como sinceras reflexões:

Excelências,

A Liga Africana sente-se sucessora da Liga Nacional Africana não apenas em virtude de muitos dos seus prestigiados e prestigiantes fundadores terem sido membros, na difícil e conturbada época colonial, desta sua antecessora; a relação de ascendência e descendência entre as duas instituições, resulta do facto da Liga Africana incorporar “ in toto” no espírito dos seus sócios e na letra dos seus estatutos, os valores de solidariedade social, difusão de virtudes culturais, disseminação do conhecimento, valorização integral da cidadania, promoção da paz e observância de paradigmas de moralidade, que já eram apanágio, formulado com o extremo cuidado que o contexto colonial exigia, dos Fundadores em 1912 da Liga Angolana e em 1930 da Liga Nacional Africana.

A interacção inteligente com as autoridades coloniais dos dirigentes daquelas duas organizações antecessoras da actual Liga Africana não impediu, antes pelo contrário promoveu, que neste edifício fosse progressivamente amadurecido o sentimento, segundo o qual, Angola tinha que libertar-se do colonialismo. Muitas das graúdas figuras conhecidas do nacionalismo angolano foram membros e em alguns casos lídimos dirigentes das nossas antecessoras;

Ao ter sido alcandorado pelos sócios da Liga Africana para este posto de Presidente da Direcção da Liga Africana, apenas posso compreende-lo no contexto de infinita bondade dos meus compatriotas, porquanto nenhum dos meus humildérrimos atributos e conhecidas fragilidades, podem assemelhar-se às inemuláveis qualidades de graúdas figuras desta urbe e ex-presidentes da Liga, como foram os casos de António Assis Júnior (1930-1933), Francisco Alves Fernandes (1933-1936), Manuel Pereira do Nascimento(1936), João Cândido Furtado D´Antas (1937), Cónego Manuel Joaquim Mendes das Neves (1941-46) e outros antes da Independência bem como de João Baptista de Castro Vieira Lopes e finalmente António de Oliveira Madaleno, que por graça tanto sua como Providencial, permitiu que sejamos seu substituto.

Um sentimento não desvanece apenas com construções jurídicas, quando a legalidade parece estar dissociada da legitimidade, do bom senso e da sequência natural das coisas e dos processos.

Cumprido o aspecto da agenda consistente na libertação Nacional do fardo do colonialismo, pelo qual muitos dos Pais fundadores desta Liga consagraram a sua actividade onírica, racional, física, criadora e de génio organizador, a obra do desenvolvimento humano, uma expressão de admissão relativamente recente na reflexão multidimensional da realidade das sociedades, não está e nem pode estar, pela sua natureza longitudinal na vida das nações, definitivamente acabada.

A Liga Africana inspira-se nas aspirações nobres dos país fundadores das suas antecessoras e os seus membros disponibilizam-se em trazer para este espaço de comunhão cívica de ideias e realizações, as reflexões, esforços e acções que identificam como sendo partilháveis com os consócios ou valorizantes para outros membros na sociedade, e.g. na assistência social em benefício dos que não tiveram a ventura de serem preparados suficientemente para a competitividade crescente, que se assiste na nossa sociedade; contribuir na difusão da instrução e da preparação profissional das gerações que dela mais dependem para a afirmação da sua cidadania em particular e do país no geral; apresentar-se igualmente contributiva na rede de instituições participantes no esforço nacional de disponibilizar o conhecimento, sem o qual há praticamente exclusão da cidadania nacional e mundial das pessoas, etc.

Por outro lado, a Liga Africana herdou igualmente a tradição das suas antecessoras em estar próxima das nossas diásporas, estando bem documentada, por exemplo, na correspondência de Higino Aires Machado, membro da Direcção da Liga Nacional Africana na segunda metade dos anos 40 do século passado, enviada ao então estudante de medicina em Lisboa e Coimbra e posteriormente, de saudosa memória primeiro Presidente do nosso país, Dr. António Agostinho Neto, na qual este era convidado a dirigir a filial da Liga em Lisboa.

Hoje a Liga Africana é um regular e respeitado participante das actividades da rede de organizações cívicas da CPLP e dos PALOP, pelo que no contacto não apenas com as diásporas mas também com representantes de outros povos, por enquanto lusófonos, se materializa igualmente a amizade e solidariedade com outros povos do mundo.

A Liga Africana pretende, no mandato trienal que hoje inicia, constituir-se exclusivamente no âmbito do preceituado no artigo 48º da Constituição da República de Angola (Liberdade de Associações) e da Lei nº 14/91 de 11 de Maio (Lei das associações), em refúgio dos seus sócios para a troca de ideias que incentivem as virtudes promotoras da paz, da justiça, da moralidade e do bem comum bem como disponibilizar-se de forma cada vez mais relevante, em parceiro dos poderes públicos instituídos, na assistência aos mais necessitados e valorização do património material e imaterial das populações.

É óbvio que as pessoas não tratam nos clubes desportivos a que porventura pertençam de assuntos relacionados com a sua religiosidade; igualmente não levam aos templos religiosos das suas opções confessionais questões fracturantes das suas simpatias desportivas na relação com outros fiéis, ou o mesmo se diria, “mutatis mutandis” das regras de convivência em outros espaços sociais não selectivos.

Na Liga Africana realizaremos sem esmorecer e enquanto os nossos corações continuarem a latir um exercício de persuasão, encorajando acções e reflexões, enquadradas nos marcos do que todos em comum aspiramos como filhos do mesmo país.

Embora possa parecer redundante mas não é extemporâneo reiterar que o ordenamento jurídico do nosso país, que preside à constituição e funcionamento das associações, não autoriza muito menos incentiva, que elas se metamorfoseiem em associações para fins lucrativos; ao não sê-lo e também nunca o foi, a Liga não pode ser, por maioria de razão, a fonte principal supridora de proventos eventualmente desmerecidos aos seus sócios. A estrita aplicação do princípio da rigorosa gestão dos parcos recursos patrimoniais e financeiros disponíveis em conciliação com a pauta de actividades efectivas a levar a cabo, deve definir com lisura os termos do mérito e demérito no acesso àqueles.

Igualmente, a Liga deve contribuir para uma crescente qualificação dos seus servidores e na medida do possível atrair para os seus órgãos de apoio cidadãos com experiência empírica e conhecimentos científico-técnicos elevados, susceptíveis de tornar a Liga mais relevante para a sociedade angolana.

Recuperar e exaltar, ainda que com algum sentimento nostálgico, a profícua actividade cultural e nacionalista de nobres cidadãos ou grupos destes, no contexto da resistência generalizada ao colonialismo, é um imperativo de justiça para com aqueles e de educação das gerações actuais.

Estas reflexões, Excelências e estimados colegas e amigos, são os ideais que vão traduzir-se em planos, projectos, programas de actividades e acções da Liga Africana, esperando que continue a ser-nos concedida por todas pessoas de bem, suficiente apoio moral e material, à medida das possibilidades de cada sócio, cidadão ou instituição, para melhor homenagearmos os visionários e distintos fundadores e dirigentes que nos legaram este importantíssimo instrumento de intervenção e valorização social dos angolanos: A LIGA AFRICANA.


Muito obrigado pela vossa atenção.

Luanda, 7 de Fevereiro de 2015


Carlos Mariano Manuel
Presidente da Liga Africana


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